sábado, 6 de novembro de 2010

Carros elétricos: as 12 questões essenciais

Salões do automóvel costumam ser vistos, à margem dos carros realmente lançados no mercado, como espaços futuristas, de protótipos ao estilo Jetsons, que nunca alcançam os consumidores. 

Durante muito tempo, os híbridos (com dois motores, um de combustão e outro elétrico) e os elétricos puros-sangues pertenciam a esse grupo utópico, de prancheta e computador. Não é mais assim. No recente Salão de Paris, encerrado na semana passada, havia eletricidade no ar, e as estrelas do show foram os modelos ecologicamente corretos. O Salão de São Paulo, de 27 de outubro a 7 de novembro, também terá cores limpas - embora os elétricos, no Brasil, ainda demorem a desembarcar. Durante o evento francês, VEJA ouviu especialistas para explicar como essa mudança sobre rodas está acontecendo e por que ela é inexorável.


1. CARROS A BATERIA TÊM FUTURO?
Sim. "Começou a era dos automóveis limpos, sustentáveis e silenciosos", disse o alemão Dieter Zetsche, presidente mundial da Daimler, a  revista VEJA. O movimento, segundo ele, será nítido: ao lado de modelos movidos a petróleo, com mais tecnologia embarcada - e cada vez mais eficientes -, haverá espaço para os automóveis híbridos (com motor de combustão e elétrico), os puramente elétricos e, mais tarde, os movidos a hidrogênio. Até 2012 espera-se o lançamento de duas dezenas de veículos dessa família.

2. QUANTOS CARROS HÍBRIDOS OU ELÉTRICOS RODARÃO NO PLANETA EM 2020?
Segundo as previsões do Departamento de Energia dos Estados Unidos, daqui a dez anos os carros com tecnologias alternativas ao petróleo serão 8 milhões, cerca de 15% da produção mundial. Aos movidos puramente a bateria, caberia um fatia anual estimada em 3% (segundo a Volkswagen), 5% (de acordo com a Peugeot-Citroën) e até 10% (com base em previsões da Renault-Nissan). "Carros elétricos representam uma irreversível revolução na mobilidade", disse a VEJA o brasileiro Carlos Ghosn, presidente mundial da Renault-Nissan. Em três anos, o grupo pretende lançar oito modelos movidos a bateria e vender 500 000 automóveis desse tipo a cada ano.

3. DÁ TRABALHO RECARREGAR UM CARRO ELÉTRICO?
Trata-se, aqui, de mudança de hábito - e de construção de estruturas de recarga nas cidades e estradas. "Mas alimentar um carro elétrico é simples como pôr um telefone celular na tomada", afirma o francês Jean-Marc Debeaux, diretor de estratégia e inovação da Schneider Electric, uma das empresas líderes na pesquisa de soluções de recarga na Europa. "Basta deixar o carro conectado por seis horas a uma tomada de 240 volts ou, ainda, cerca de quinze minutos para uma recarga rápida, o suficiente para abastecer 80% da bateria." Com carga total, a autonomia varia de 160 quilômetros, para o Nissan Leaf, a 360 quilômetros, para um esportivo como o Tesla Roadster.

4. PAGO MENOS RODANDO COM ELETRICIDADE?
O custo para percorrer 10 quilômetros na cidade com um carro a gasolina é de R$ 2,50. No volante de modelos elétricos paga-se um sétimo desse valor. Sem falar no tão esperado fim de gastos com manutenção no sistema de embreagem, troca de óleo e filtros de combustível, escapamentos ou radiadores. O nó a ser desatado é o preço do pacote de baterias, ainda elevado: cerca de 35 000 reais. É o suficiente para abastecer um carro a gasolina por cerca de 140 000 quilômetros.

5. ENTÃO POR QUE OS CARROS MOVIDOS A BATERIA ESTÃO NA MODA?
"Por causa de um aperto constante nas leis ambientais e do desejo crescente dos consumidores de ter automóveis mais limpos", diz o francês Guillaume Faury, vice-presidente de pesquisa e desenvolvimento da Peugeot-Citroën. Até 2016, o governo dos Estados Unidos quer carros 40% mais econômicos e limpos. Há normas similares prontas para entrar em vigor na Europa, China e Japão. Sem a ajuda dos motores elétricos, trata-se de uma meta impossível de cumprir. Outro bom motivo é o preço do barril de petróleo, que chegou a um pico de 147 dólares em julho de 2008 e pode subir no futuro, à medida que sua exploração se torne mais cara.

6. CARRO ELÉTRICO É SINÔNIMO DE EMISSÃO DE CO2 ZERO?

Em termos. Quando rodam com a energia de suas baterias, os carros híbridos ou elétricos não emitem 1 grama de gás carbônico. Mas os ecologistas recomendam levar em conta também a fonte da energia que abastece as tomadas para recarregá-las - se a eletricidade vem de usinas a carvão ou gás natural, por exemplo, a sujeira no ar permanece. Na região de Chicago, nos Estados Unidos, onde se prevê 1,8 milhão de carros com motores alternativos em 2020, calcula-se que os elétricos emitam 36% mais CO2 do que os modelos a gasolina, porque 75% das usinas são termelétricas, acionadas por carvão ou gás.

7. AS BATERIAS DE CARROS SÃO PARECIDAS COM AS DE LAPTOPS E CELULARES?

As atuais sim. Elas são feitas de íons de lítio, semelhantes às que equipam os aparelhos eletrônicos. O primeiro carro elétrico dos tempos modernos foi um Lotus Elise recheado com 6 831 baterias de íons de lítio, de telefone celular. Quem teve a ideia maluca, em 2003, foi Martin Eberhard, diretor da Tesla, uma pequena montadora americana da Califórnia. Batizado de T Zero, o protótipo acelerou de zero a 100 quilômetros por hora em 3,5 segundos e rapidamente virou moda entre os descolados.

8. O PREÇO DAS BATERIAS ESTÁ EM QUEDA?
A consultoria americana McKinsey estima que, desde 2003, o preço das baterias para automóveis tenha caído a uma média de 10% ao ano, enquanto a quantidade de energia armazenada por módulo cresce em torno de 5% a cada doze meses. Assim como aconteceu com os primeiros celulares, enormes e caros, a tendência é uma forte queda no preço delas no futuro. A aposta é que custem a metade do que valem hoje dentro de seis a oito anos.

9. AS BATERIAS SÃO MAIS EFICIENTES DO QUE O PETRÓLEO PARA ESTOCAR ENERGIA?
Não. Para dispor de uma autonomia de 160 quilômetros, é necessário embarcar 250 quilos de bateria de íons de lítio, três vezes e meia o equivalente em gasolina. Mas há progressos, e a densidade de energia estocada não para de aumentar. Há duas décadas, uma bateria de chumbo ácido armazenava um sexto da energia de uma bateria de íons de lítio de hoje em dia.

10. O ALTO PREÇO DAS BATERIAS INVIABILIZA OS CARROS ELÉTRICOS?
Hoje, as baterias equivalem a 34% do custo de um automóvel 100% elétrico.Para tentarem reduzir o impacto, as montadoras pretendem alugar as baterias ou os próprios carros elétricos. Será o caso do compacto BlueCar, desenvolvido pelo fabricante de baterias francês Bolloré e pelo estúdio italiano Pininfarina para o mercado europeu. "Nossa meta é fazer circular 40 000 carros em 2013", contou a VEJA o industrial francês Vincent Bolloré, sócio no empreendimento, um dos onze homens mais ricos da França. Inicialmente, esse modelo, recarregável na tomada, não será vendido, mas alugado pelo equivalente a 23 reais por dia, com uma autonomia de 220 quilômetros. A Renault-Nissan associou-se a uma empresa israelense, a Better Place em uma inovação decisiva, um ovo de colombo real: postos de troca de baterias sem a necessidade de esperar a recarga.

11. OS GOVERNOS ESTÃO AJUDANDO A PAGAR A CONTA DOS CARROS A BATERIA?
Sim. Nos Estados Unidos, o Nissan Leaf será lançado no fim do ano por 25 280 dólares, já descontados 7 500 dólares de incentivos federais. Se os compradores morarem em estados como Geórgia ou Califórnia, pagarão pouco mais de 20 000 dólares, graças a outro benefício fiscal, equivalente a 5 000 dólares para elétricos (ou 3 000 dólares para um plug-in híbrido como o Volt). Na Inglaterra, a ajuda é equivalente a 7 800 dólares; na Bélgica, a 11 200 dólares. "Sem esses incentivos, apenas poucos consumidores poderão se interessar por esses veículos", explica Simon Sproule, diretor de comunicação da Renault-Nissan.

12. QUANDO SERÁ POSSÍVEL COMPRAR UM CARRO ELÉTRICO NO BRASIL?
Vai demorar algum tempo. O empresário Eike Batista planeja montar carros desse tipo por aqui até 2014, em uma usina situada no norte fluminense. Mas, graças ao etanol, que movimenta boa parte de sua frota de automóveis, por enquanto as grandes montadoras brasileiras estão à margem dessa onda. "Nosso caminho será fazer motores térmicos cada vez mais eficientes", diz Cledorvino Belini, executivo da Fiat e atual presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). "A tecnologia dos elétricos e mesmo dos híbridos plug-in ainda é cara diante de uma alternativa fantástica como a que temos por aqui." Mas, por via das dúvidas, em parceria com a Itaipu Binacional, a empresa que toca a maior hidrelétrica do planeta, a Fiat desenvolveu um protótipo 100% elétrico. Baseado em um Palio com motor 1.0, ele é equipado com bateria de níquel e tem autonomia para rodar até 120 quilômetros na cidade. A CPFL, de São Paulo, desenvolveu modelos a eletricidade para servir aos Correios.

FONTE: Revista Veja